Armageddon - Nicholas Roerich
Eu, que moro no interior do estado de São Paulo, tenho vivido semanas estarrecedoras. Porque chove fuligem sobre as ruas, as casas, a minha cabeça… porque o céu mudou de cor… porque meus olhos, pele, nariz reagem à fumaça que me envolve continuamente… porque as notícias dos incêndios se repetem, com cenas que meus sentidos avisam o tempo todo quão perto estão…
Ainda é cedo para falar de tudo isso. Não porque ainda não haja motivos para questionarmos por que continuam ocorrendo, dia após dia, sem que as instituições responsáveis por evitar tais eventos tomem atitudes eficazes. Mas porque a minha mente ainda não foi capaz de entrar em alguma ordem diante de tanto caos.
Entretanto, a premência é por falar por aqueles que não falam - a nossa língua -, mas cujas vidas estão sendo muito mais impactadas do que as nossas: os animais.
Os animais estão perdendo a vida pelo fogo. E os sobreviventes estão sob as condições mais desastrosas possíveis: têm sede, fome, estão feridos, têm dor, foram separados de suas famílias, lhes falta o abrigo, voaram para longe e não têm para onde voltar, ou seus narizes tocam o chão cheio de fuligem, têm pavor.
E, entre tantos desafios, um dos mais difíceis tem sido enfrentar as notícias sobre os incêndios que, após algumas descrições impactantes sobre o número de hectares atingido e se houve paralisação de trânsito na rodovia, finalizam dizendo que “felizmente não há feridos”. Sei que estão se referindo à não ocorrência de acidentes com seres humanos, mas, justamente, a ausência de menção aos outros seres vivos escancara um dos aspectos do paradigma que nos trouxe até este inferno: o antropocentrismo quase sádico que ignora sem pudor a morte e a dor dos animais.
Lara Padilha
11 de setembro de 2024 - um triste Dia do Cerrado em São Carlos
Este texto emociona, mas, mais que isso, denuncia os crimes e anuncia a resistência necessária. Estamos juntas, Lara